terça-feira, 16 de setembro de 2014

O banqueiro anarquista - Fernando Pessoa

O banqueiro anarquista, de Fernando Pessoa (Antígona)
Ano: 1922

Sinopse:
O paradoxo do próprio nome deste pequeno livro de Fernando Pessoa mostra bem a discussão  que acontece nele. A história, se a há, é muito simples: Uma conversa entre dois homens, em que um deles, sendo banqueiro, se diz anarquista, e o outro que, como seria de esperar, duvida do anarquismo do seu interlocutor por este ser banqueiro, esse arauto do capitalismo. Durante esta discussão, Pessoa consegue justificar esta aparente contradição através do seu génio, utilizando uma profunda fundamentação e demonstrando um anarquismo diferente de todo aquele experimentado até hoje.
Nesta edição da Antígona, em vez de uma sinopse vem um excerto de um texto escrito pelo próprio Fernando Pessoa:
"Tão regrada, regular e organizada é a vida social portuguesa que mais parece que somos um exército do que uma nação de gente com existências individuais. Nunca o português tem uma acção sua, quebrando com o meio, virando as costas aos vizinhos. Age sempre em grupo, sente sempre em grupo, pensa sempre em grupo. Está sempre à espera dos outros para tudo.
Somos incapazes de revolta e de agitação. Quando fizemos uma "revolução" foi para implantar uma coisa igual ao que já estava. Manchámos essa revolução com a brandura com que tratámos os vencidos. E não nos resultou uma guerra civil, que nos despertasse; não nos resultou uma anarquia, uma perturbação das consciências. Ficámos miseravelmente os mesmos disciplinados que éramos.
Trabalhemos ao menos - nós, os novos - por perturbar as almas, por desorientar os espíritos. Cultivemos, em nós próprios, a desintegração mental como uma flor de preço. Construamos uma anarquia portuguesa."
Fernando Pessoa, O jornal, 8-4-195 (excertos)

A meu ver, para melhor se conhecer o génio de Fernando Pessoa, é preciso conhecer-se tão bem, ou melhor, as suas obras em prosa como a sua obra poética. É na prosa que Fernando Pessoa muitas vezes revela as suas orientações metafísicas (como no drama estático O Marinheiro), emocionais (como no Livro do Desassossego), ou sociais (como neste O Banqueiro Anarquista). Neste conto de raciocínio, como o próprio Fernando Pessoa o chama, o personagem principal defende que o verdadeiro e único mal na sociedade são as convenções, ou ficções sociais, desde o dinheiro, ao Estado, à religião e ao próprio conceito de família. Um a um, Fernando Pessoa vai desconstruindo com argumentos fundamentados os dogmas que ainda hoje temos da mesma maneira que a sociedade tinha na altura de Pessoa. Ao mesmo tempo, para além de criticar o estado social em que o país se encontra(va) e defender o anarquismo, o personagem principal levanta-se contra a forma de se fazer anarquismo, afirmando que essa corrente social nada tem a ver com os sindicatos e os bombistas, que "são o lixo do anarquismo, os fêmeas da grande doutrina libertária".
Sendo um conto de raciocínio e não própriamente um romance, avalio esta obra como obrigatória para uma consciência social.

Felizmente, é possível lê-lo online Aqui.


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